domingo, 7 de dezembro de 2014

Paris não tem centro [2015]


Paris não tem centro 
[passagem de Érica Zingano].
[Rio de Janeiro: Megamíni, 2015.]

1 poema nesta coleção em pequeno formato,
escrito em francês e traduzido ao português pela érica zíngano.


Paris não tem centro [2a edição]
[Rio de Janeiro: 7letras, 2016.]
Versão ampliada.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Um teste de resistores [2014]


Um teste de resistores 
[Rio de Janeiro: 7letras, 2014] 

Sumário do livro: 
Blind light [leia um excerto]
Ordem alfabética [vídeo]
Você chorou em Bruxelas?
No aeroporto Schönefeld de Berlim
Na 19a edição da meia maratona de Lisboa
Ztaratztaratsztaratztaratztaratztaratztaratz
Uma mulher que se afoga
Uma partida com Hilary Kaplan
O que é um começo?
Sobre o Atlântico
A poesia é uma forma de resistores?





* resenha, por Ricardo Domeneck, em sua coluna no site do jornal DW
* resenha, por Matheus Mavericco, no site Escamandro.
* resenha, por Pedro Mexia, na revista E.
* resenha, por Juliana Brina, aqui.
* resenha, por Rob Packer (in english, a review on book), aqui.
* resenha, por Maurício Chamarelli Gutierrez, 
       publicada no Fórum de Literatura Brasileira Contemporânea, aqui
* artigo sobre o livro, por Danielle Magalhães, na Revista Escrita (PUC-RIO), n. 23.



Um teste de resistores, 2a edição [Rio de Janeiro: 7letras, 2016]


Um teste de resistores [Lisboa: Mariposa Azual, 2015]


trailer 1:

 

domingo, 30 de novembro de 2014

20 poemas para o seu walkman [2007]



20 poemas para o seu walkman
[São Paulo/ Rio de Janeiro: Cosac Naify, 7letras, 2007]
Leia um poema aqui: Svetlana



2a edição: 20 poemas para o seu walkman
[Rio de Janeiro: 7letras, 2016]


já me perguntaram algumas vezes sobre a capa da nova edição do "20 poemas para o seu walkman". como não entrou nenhum crédito no miolo, conto 2 histórias sobre ela.
as ondas que desenhei ali representam os sons do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko gravados pela sonda rosetta, em 2014. a partir dos gráficos de som que peguei na internet, fiz algumas experiências e desenhos para chegar nessa ilustração. (colo abaixo:)
na época de fechar a capa do livro, fui para um festival na romênia e, por engano, acabei imprimindo um dos poemas que leria no festival em cima do gráfico de som do cometa. só me dei conta do engano na hora da leitura e precisei ler o poema assim mesmo, sobreposto ao gráfico. antes da leitura expliquei em inglês que era um "poema de amor" e, como não entendiam nada do que eu lia em português e viram o desenho que me servia de "partitura", acabaram dizendo depois que meu texto estava escrito não em português, mas na linguagem dos eletrocardiogramas, e que na verdade eu estava lendo as batidas do coração...




20 poemas para tu walkman
[Bahía blanca: Vox edicciones, 2012.]
Trad. de Diana Klinger, Mário Camara e Paloma Vidal.
leia alguns poemas traduzidos na revista Grumo

* resenha da edição argentina, por Franco Castignani, no site Otra parte.


Engano geográfico [2012]

Engano geográfico 
[Rio de Janeiro: 7letras, 2012.]

* artigo de Victor Heringer, no site Fórum de literatura brasileira contemporânea.

* artigo de Pablo Simpson, na revista Contexto.

* leitura de Rob Packer, no wordpress do autor, Nomadic permanence.

* artigo de Flora Süssekind em que analisa alguns livros, 
dentre os quais o engano geográfico. O Globo.


***


Error geográfico [entre resistores]
Barcelona: Kriller71, 2015.
Trad. de Aníbal Cristobo
Edição que inclui o poema engano geográfico + poemas dos livros 
um teste de resistores e 20 poemas para o seu walkman



* resenha do livro, por Cristina Elena Pardo, no site Pictograma.

* resenha do livro, por Patricio Grinberg, no site La tribu de Frida.

Svetlana – Marília Garcia

na véspera de sua partida para 
ny, emmanuel hocquard datilografa
um poema de george oppen
em sua máquina de escrever
underwood n. 3. é como svetlana querendo voltar
para barcelona aqui não fico
mais nem um dia dizia no café
com nome grego que
lhe fazia falta ver as coisas
invisíveis daquela cidade e seu marido
na contramão carregando
no braço o menino sem língua,
tentando alcançar o que
aparecia do outro lado do mar
se alguém ainda viria
para ajudá-los
                         nesta época
do ano a tormenta não costuma
demorar (o poema era em inglês)
e tinham medo de se perder, 
ela dizia, por isso a distância,
ritmo de degrau seguindo
cortado, por isso
                           o modo de andar e
o ziguezague do avião sempre que saíam juntos. 
tinham medo e todos os dias fazia
algo para evitar. depois queria 
encontrá-lo na rua,
perdido, como um acidente:
cruza uma esquina e vê. desligou
a chamada na hora
precisa, a voz cortada outra
vez antes de seguir
pelas ramblas.

[poema do livro 20 poemas para o seu walkman. são paulo: cosac naify, 2007.]

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Um teste – Thiago Gallego

ontem à noite comecei a ler o livro novo da marília garcia
um teste de resistores
comecei a ler pelo último poema
a poesia é uma forma de resistores?
comecei a ler pelo último poema porque já tinha ouvido uma versão dele
lida pela marília na casa de leitura dirce côrtes
no humaitá
e tinha vontade de ouvir de novo
acontece que quando li o último poema
a poesia é uma forma de resistores?
não era a minha voz na minha cabeça
que lia o poema
era a voz da marília nos encontros
da casa de leitura dirce côrtes
e hoje no ônibus quando comecei o primeiro
poema e o que vem logo depois dele
ainda era a voz da marília na minha cabeça
fiquei fascinado pela ideia de ler com uma voz e um ritmo
tão diferentes do meu
fiquei fascinado e imaginei que todo o livro seria isso

desci do ônibus pensando com aquele ritmo aquela voz e escrevendo com eles
também
passei o dia assim

ao contrário do que eu esperava
conforme avançava
no anfiteatro da puc
em outros dois ônibus
a voz na minha cabeça foi se tornando um híbrido
entre a da marília e a minha
ora era como eu e quase só eu
lendo
ora era a marília
mas na maior parte
um dueto

escrevo com algum medo de que soe uma tentativa
de imitar texto tão vivo
ainda assim escrevo
num híbrido algo tosco
de vozes
porque acho bonito
muito bonito
quando uma coisa dessas
um ataque direto do poema no corpo
feito bactéria
acontece

-----------------------

no dia 22 de agosto de 2014
recebi um email do thiago gallego com este poema
o thiago gallego explicava no email que estava lendo um teste de resistores
e que no calor da hora tinha feito esse teste
depois recebi outros poemas que conversavam com um teste de resistores
e por sugestão do dimitri (que também fez um
vou reunir esses textos-testes aqui 
fazendo uma espécie de antologia-em-diálogo.
o thiago gallego é carioca, estuda cinema 
e é um dos editores da bliss não tem bis http://blissnaotembis.blogspot.com.br

sábado, 4 de outubro de 2014

Epopeia, uma aventura de Batman -- Christophe Fiat


À noite,
em Gothan City,
tudo é imenso
tudo acontece
no infinito
das aventuras
do Batman.
Vemos apenas
as chamas
e as imagens
se sobrepõe
como as tantas
manchetes
que anunciam
as mudanças
feitas
na cena do crime.
Numa das manchetes
lemos
EU VOU MATAR VOCÊ!
e entendemos
ELE DIZ QUE VAI MATAR VOCÊ
Então Batman faz sua ronda
como um animal
no grande cenário
natural
de Gotham City,
Batman fala pouco.
Sua voz responde.
Ela é rápida
atonal
plana
horizontal
neutra.
Batman tem
a loucura comum
aos aventureiros
que tratam
a noite
como um inferno.
Batman diz BANG!
BIFF! CRUNCH! ZAP!
Se Batman fala pouco,
ele bate muito
Muitas vezes ele mata [...]

Quando Batman
diz sim!
E faz BANG!
BIFF! CRUNCH! ZAP!
Batman passa à ação
Então a noite
de Gothan City
se ilumina por um instante
com as chamas da ação
de Batman
Então ele está
no auge
da sua vida mítica-real
que avalia
todas as transformações
ocorridas
como as transformações
de um homem
em morcego.
O problema
de Batman
é que nunca sabemos
se estamos
em um filme de criminosos
ou num filme policial
porque
quando Batman bate
ele passa sem distinção
da situação ao duelo
(filme de criminosos)
e do duelo à situação
(filme policial).
Para Batman
todas as ações
são cegas
e todas as situações
são obscuras
e a noite
de Gotham City
é o teatro de operações
de uma catástrofe
que chega
como uma canção
e que atravessa os lugares
e as pessoas.
Batman
tem o senso prático
desenvolvido
É preciso lidar
com o tempo
É preciso entrar
na engrenagem
da noite
É preciso
abolir o tempo
É preciso
manter
a velocidade
de propagação
de uma imagem falsificada
por quanto tempo for possível,
sideral
e siderado e siderante
que se reparte diretamente
no rumor
das chamas
e das brigas de rua.

Na manchete
lemos
EU VOU MATAR VOCÊ!
e entendemos
ELE DIZ QUE VAI MATAR VOCÊ
Então sabemos
que se refere ao Batman.
Mesmo que seja
só uma frase
"EU VOU MATAR VOCÊ ELE DIZ QUE VAI MATAR VOCÊ"
circulando pela
noite de Gothan City
e que se propaga
numa frequência
situada entre 20 kHz
e 120 kHz
mostrando
as aventuras
entre os personagens
independentes
(Batman
e os super-herois
e os policiais
e os bandidos)
e os lugares separados
(todas as ruas
e todos as praças
e todos os prédios
de Gothan City).




este é um excerto do livro
Épopée, une aventure de Batman, publicado pela al dante, niok, em 2004,
e que eu li na antologia Sac à dos, une anthologie de poésie contemporaine pour lecteurs en herbe, organizada por Jean-Michel Espitallier

domingo, 31 de agosto de 2014

QQQQQ (excerpt A-Because) – Lenka Clayton



a lenka clayton é uma artista britânica (n. 1977). 
a lenka clayton pôs em ordem alfabética 
o discurso do Bush sobre o terrorismo de 29/01/2002.
o nome do trabalho (qqqqqq) é um trecho da ordem alfabética: 
qaeda quality question quickly quickly quiet 
o bush diz america/ns em torno de 60 vezes

segunda-feira, 21 de julho de 2014

O terremoto enquanto ela dormia – Mary Jo Bang



Ela dormia durante um terremoto na Espanha.
No dia seguinte, tudo ficou cheio de coisas mortas. 
                                                                        [Bom, não cheio, mas com algumas coisas.
Diante da porta da frente, sentiu um estalo de carrapato

debaixo do pé. No banheiro, uma barata enorme deitada
com as patas pra cima na beira do mármore; a antena
morta anunciando o futuro, virada na direção do olho prateado

que depois iria tragar a água com a qual ela lavou o rosto.
Quem não gostaria de voltar rápido
para o sono da noite anterior? Sabia que tinha que seguir acordada

e enquanto caminhava pela névoa cinzenta do dia, enganava o vaporoso
encenando algo concreto: a fumaça do cigarro,
por exemplo, poderia se transformar em um edifício de Lego de 2 cm

visto da janela de um ônibus que bloqueava uma rua.
Às vezes, as pessoas pensam em si mesmas como uma foto que coincide
com um desejo inventado: uma floresta de brinquedo, um grilo mutilado, o mais

ou menos precioso lótus. Na noite antes do terremoto, tomou um trem
para ver uma ópera cômica com um enredo inverossímil. Reparou num homem
com casaco curtido e gravata que lembrava muito o Kafka.

No dia seguinte, ligou para um amigo para reclamar dos insetos.
De uma cidade distante – a voz baixa e em tom de lamento –, ele disse,
Você não está bem? Quer que eu faça alguma coisa?





mary jo bang nasceu em 1946, nos estados unidos.
este poema de mary jo bang será publicado no livro the last two seconds
ainda no prelo em inglês
mas já saiu (e foi onde eu li o poema e também onde li a mary jo pela primeira vez)
na linda antologia, essa aí da foto em cima, El clarooscuro del pinguino, traduzida para o espanhol por aníbal cristobo e patricio grinberg e publicada pelo aníbal cristobo na kriller71 edicciones.
minha tradução foi feita, ao mesmo tempo, do inglês que vem no rodapé dos poemas e da versão em espanhol. por ser o espanhol mais próximo do português e por eu ter lido essa versão antes do original, será que posso dizer que fiz uma espécie de cotradução? de todo modo, usei soluções da versão espanhola, então aqui está o crédito e agradecimento aos tradutores amigos. e aproveito o post para dar parabéns aos 2 anos da kriller71 ediciones e agradecer por essas maravilhas que ela vem fazendo...


domingo, 20 de julho de 2014

Encontro – Harold Pinter



Nas horas mortas da noite

Os que há muito estão mortos olham para
Os novos mortos
Que avançam até eles

Há um leve bater do coração
Quando os mortos abraçam
Os que há muito estão mortos
E os que entre os novos mortos
Para eles avançam

Choram e beijam-se
Quando voltam a encontrar-se
Pela primeira e última vez


Tradução de Pedro Marques, Jorge Silva Melo e Francisco Frazão
poema copiado do livro Guerra, da Quasi edições.


domingo, 22 de junho de 2014

"Blind light" (excerto) -- Marília Garcia


1.
no filme pierrot le fou de jean-luc godard
tem uma cena em que os amantes ferdinand e marianne 

estão fugindo em um carro conversível vermelho
por uma estrada ensolarada
no litoral sul da
frança


nesta cena de pierrot le fou
a câmera filma os dois a partir do banco de trás do carro

nesta cena de pierrot le fou
o ponto de vista do espectador é de quem está de fora 
porque os dois estão de costas para a câmera
apesar disso a estrada vai se abrindo à frente
e o movimento carrega todo mundo pra dentro da história


nesta cena de pierrot le fou
o diálogo que ocorre entre ferdinand e marianne
tem um tom bastante leve
para a gravidade do assunto
eles discutem o que farão agora
depois de fugirem juntos depois que ele largou mulher e
filha 
depois de se envolverem com tráfico de armas
com um assassinato e de roubarem este carro
ferdinand quer parar em alguma praia tranquila
e
ficar com marianne por um tempo
ferdinand diz mais de uma vez que está apaixonado
mas marianne responde que eles precisam de dinheiro
ela sugere que procurem seu irmão para conseguirem grana 

e poderem ir para um hotel chique se divertir

nesse momento ferdinand se vira
olhando para trás na direção da câmera
e diz                                 
– estão vendo
ela só pensa em se divertir
marianne se vira também olhando para trás
na direção da câmera
e pergunta pra ele                      –
com quem você está falando?
ao que ele responde                   – com o espectador

esse curto diálogo de pierrot le fou
contribui para dar ao filme sua dimensão de filme 
de algum modo essa menção ao espectador
fura o
filme e insere nele uma espécie de
corte
interrupção
que dá a ver mais concretamente
a dimensão da
montagem no cinema
a mídia que poderia passar desapercebida
no produto
final
irrompe no
filme criando uma descontinuidade


o que sinto ao pensar em você
ela disse
é um furo

se penso na poesia
quais recursos                ao lado do corte 

poderiam contribuir para tornar o poema 
um poema


*******

este é um fragmento do poema "blind light"
primeiro poema do meu novo livro, um teste de resistores.
um teste de resistores está no prelo e sairá pela 7letras no segundo semestre.
em breve, mais notícias.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Bolsistas da Fulbright -- Ted Hughes





Onde teria sido, na Strand? Notícias
Em exposição, fotografias.
Não sei por quê, me chamou a atenção.
Uma foto da mais recente leva
De bolsistas da Fulbright. Prestes a vir --
Ou recém-chegados. Ao menos alguns.
Você era um deles? Examinei a foto,
Não muito a fundo, me perguntando quais
Eu talvez viesse a conhecer.
Lembro de ter pensado nisso. Não lembro
Seu rosto. É claro que olhei mais
Para as moças. Reparei talvez em você.
Quem sabe a avaliei, e achei pouco provável.
Vi seus cabelos longos, ondas soltas --
A franja à Veronica Lake. Não o que ela escondia.
Loura, eu teria pensado. E o seu sorriso.
Seu sorriso americano exagerado
Para as câmeras, os juízes, os estranhos, os atemorizadores.
Depois esqueci. Mas me lembro
Da foto: os bolsistas da Fulbright.
Com bagagem e tudo? Pouco provável.
Teriam vindo todos juntos? Eu estava caminhando,
Pés cansados, sol forte, calçadas quentes.
Foi então que comprei um pêssego? É o que lembro.
Num quiosque junto à estação de Charing Cross.
O primeiro pêssego fresco que jamais comi.
Tão gostoso que mal acreditei.
Aos vinte e cinco anos, mais uma vez surpreendi-me
De ver que ignorava as coisas mais simples.



Tradução de Paulo Henriques Britto

neste livrinho da Record
Cartas de aniversário


terça-feira, 27 de maio de 2014

Eine nationale poesie? – Jacques Roubaud


Osnabrück, 27 de novembro de 1993.

@1

@1.1 Na minha família, o telefone não penetrou antes de 1945. Eu tinha doze anos. Era um aparelho grande e assustador, uma espécie de divindade, sem dúvida hostil. Meu pai não queria responder ao seu chamado, muito menos servir-se dele. A minha mãe cabia a tarefa de exorcizá-lo. Mas ela mesma não deve ter conseguido dominá-lo realmente. Com efeito, tendo-se passado vários anos, tínhamos deixado Carcassone, onde vivêramos durante toda a guerra (lembro-vos que houve uma guerra entre 1939 e 1945), e tínhamos vindo viver em Paris e um dia minha mãe recebeu um telefonema de uma velha amiga de lá, de antes. Elas falaram por um momento, deram notícias das famílias, das crianças, e, no momento de se deixarem, minha mãe disse: "Não vamos mais ficar tanto tempo sem nos falar. Toma o meu número de telefone." "É, você tem razão, me dá o número", começou a dizer a amiga. Neste momento, as duas começaram a rir.

@1.2 Quanto a mim, não avancei muito no domínio deste instrumento. Quando recebi uma chamada de Hamburgo me perguntando o título de minha intervenção de hoje, tive um momento de pânico. Pensando na inacreditável distância percorrida pela voz que chegava dessa maneira inverossímil à minha orelha, respondi bruscamente, com uma hesitação interrogativa na voz e na orelha: "uma poesia nacional?". E foi assim que me veio esse título e numa espécie de alemão que creio totalmente adequado e que adoto, consequentemente, pronunciando-o à minha maneira de quase analfabeto em assuntos germânicos: "Eine nationale Poesie?"

@1.3 Procederei da seguinte maneira. Num primeiro momento questionarei a ideia de nação. Num segundo momento me perguntarei o que a poesia pode ter a ver com a nação. Permanecerei mais ou menos no modo interrogativo, não tendo muitas respostas a oferecer, o que não me impedirá de expressar-me de maneira peremptória, como todo mundo.

@ 2
@2.1 Já faz alguns anos, a França, querendo mostrar que não guardava rancor da Alemanha por certos mal entendidos ocorridos em sua recente história comum, resolveu tomar-lhe emprestado a concepção de um movimento político de tendências fascistas, cujo nome é Frente Nacional e cujo chefe (era preciso ter um chefe) se chama Le Pen.

@2.2 Uma das ideias da Frente Nacional é: "A França aos franceses!", ou ainda "Fiquemos entre nós e as vacas estarão bem guardadas." Há estrangeiros demais na França, dizem, eles nos invadem, como outrora o fizeram os árabes vencidos por Charles Martel (um membro de honra da Frente Nacional) em Poitiers, em 732. Eles comem nosso pão, arruinam nossa segurança e nossa seguridade social. Em suma, "Eles vêm em nossos braços / estrangular nossos filhos e nossos companheiros". Bem, pelo menos simbolicamente.

@2.3 Então é preciso se livrar dos estrangeiros.

@2.4 Mas aí encontramos um problema. Se enviamos os estrangeiros de volta a seus lares, isso significa que, de modo claro e indiscutível, sabemos distingui-los dos franceses, que devem ficar em seu país. O que é um francês?

@2.5 Debruçando-se sobre a questão, a Frente Nacional, pela voz de seu chefe (é preciso um chefe que fale em nome de todos) propôs uma definição do francês.

@2.6 Definição de Le Pen: É francês aquele ou aquela cujo pai e cuja mãe são franceses.

@2.7 Entusiasmado por esta definição, compus o seguinte poema, já traduzido para várias línguas, digo com orgulho (isso não ocorre com tanta frequência), incluindo o alemão.

@2.8 Atenção: o poema deve ser dito bem rápido!

@ 2.9 Poema:

Le Pen é francês?

Se Le Pen fosse francês, segundo a definição de Le Pen, isso quereria dizer que, segundo a definição de Le Pen, a mãe de Le Pen e o pai de Le Pen teriam sido eles mesmos franceses segundo a definição de Le Pen, o que significaria que, segundo a definição de Le Pen, a mãe da mãe de Le Pen, assim como o pai da mãe de Le Pen, assim como a mãe do pai de Le Pen, sem esquecer o pai do pai de Le Pen teriam sido, segundo a definição de Le Pen, franceses, e consequentemente a mãe da mãe da mãe de Le Pen, assim como a mãe do pai da mãe de Le Pen, assim como a mãe da mãe do pai de Le Pen, e a mãe do pai do pai de Le Pen teriam sido francesas segundo a definição de Le Pen, e da mesma maneira e pela mesma razão o pai da mãe da mãe de Le Pen, assim como o pai do pai da mãe de Le Pen, assim como o pai da mãe do pai de Le Pen, e o pai  do pai do pai de Le Pen teriam sido franceses sempre segundo a mesma definição, a de Le Pen
donde se concluirá sem problema e sem a ajuda de Le Pen ao se seguir o raciocínio
ou que existe uma infinidade de franceses que nasceram franceses segundo a definição de Le Pen, viveram e morreram franceses segundo a definição de Le Pen depois da aurora do começo dos tempos ou
que Le Pen não é francês segundo a definição de Le Pen.

Jacques Roubaud, provençal

@2.10 Tive que assinar provençal, não sendo eu francês, mas mais ou menos provençal, em todo caso o sou se remontar algumas gerações. (eu incluiria de bom grado o troubadour Rubaut entre os meus ancestrais, mas não consegui ainda determinar todos os elos perdidos de minha genealogia).

@2.11 A segunda alternativa, qual seja, que Le Pen não é francês segundo a sua própria definição, recebeu recentemente uma confirmação brilhante. Quando estive em Nova York para uma leitura no Poetry Project de St. Mark's Place e li meu poema, alguém no final me trouxe uma caneta de marca Le Pen. Ao examiná-la vi que ela era "made in Japan". Quod erat demonstrandum.


Tradução de Monique Balbuena
publicado na revista Inimigo rumor 7

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Açaí ou Cine Paissandu para Aníbal Cristobo



em 2008, o aníbal já estava morando em barcelona
em 2008, o aníbal tinha um diário online
em 2008, o aníbal escreveu 366 posts neste diário
o diário se chamava kriller 2008, yo debería estar haciendo otra cosa 
http://cristobo.livejournal.com/
um dia, em 2008, o aníbal cristobo me pediu para ocupar seu diário
esse dia foi o último dia do cinema estação paissandu
neste dia ocupei seu diário levando o aníbal para um açaí virtual

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Poema – Simon Armitage



O Frank O’Hara estava aberto em cima da mesa
mas fui direto para a agenda telefônica.
Nick tinha saído, Joey tinha um compromisso, Jim 
já estava mesmo preparando um café, por que eu não

dava um pulo lá? A Astrud Gilberto
cantava “Bim Bom” no meu walkman da Sony
e o sol começava a secar a ardósia úmida nos
telhados. Entrei sem tocar a campainha

e ele ainda não tinha se trocado nem se barbeado quando
completamos a xícara de café com o Scotch do seu velho
(eram só dez e meia da manhã mas e daí?)
e saímos para a varanda com o jornal.

Os Talking Heads tocavam no rádio. Eu
ia começar a falar de futebol quando ele 
disse: “Olha, será que você me ajuda a esvaziar 
o armário dela?” Eu disse: “Claro, Jim, estou do seu lado.”

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Aníbal Cristobo



O vídeo acima, com a linda leitura do Aníbal Cristobo, e o texto a seguir foram feitos em 2009 para o blog da modo de usar & co. Em maio de 2014, será publicado o livro novo do Aníbal, o Minha vida como bactéria, e ele virá ao Rio para o lançamento. Reproduzo o texto abaixo exatamente como saiu no blog da modo; gostaria apenas de acrescentar o link para a Kriller71 edicciones, editora criada pelo poeta em 2013 dedicada à edição de poesia e que já conta com um catálogo de traduções de pesos pesados: http://kriller71ediciones.com/inicio/


aqui a capinha do minha vida como bactéria (no prelo!)




Aníbal Cristobo nasceu em Buenos Aires, em 1971. Aníbal Cristobo viveu durante 5 anos no Rio de Janeiro, onde publicou seu primeiro livro, Teste da Iguana (1997), pela editora 7Letras, ao qual se seguiram jet-lag (2002), krill (2004) e Miniaturas Kinéticas (2005). Aníbal faz parte do conselho da revista Inimigo Rumor, verteu para o português diversos poetas hispano-americanos, como Antonio Cisneros e Gonzalo Rojas, edita a coleção argentina de poesia "bike-bike" e, em 2007, criou o site Escolhas afectivas, versão brasileira do modelo argentino Afinidades electivas, que reúne atualmente mais de uma centena de escritores. No blog kriller 71, podemos ler quase toda sua produção e também suas mais recentes traduções. Em 2002, Aníbal se instala em Barcelona, onde reside atualmente. Sua passagem pelo Brasil deixará muitas pegadas, marcas e rastros, e me lembro agora da iguana deixando seu passo na areia, figura que aparece em seu primeiro livro, mescla de velocidade e forma, mancha de luz:

Teste da Iguana

Animal: figura da velocidade
e da forma – mancha
de luz – que cruzou o caminho:
o passo da iguana e seu
selo na areia: repouso,
repetição do corpo

e o impregnado: a
pegada
como livro de paixões
e de assombro; e espelho: desdobrando
tua voz, igualando-a
com teu próprio desejo
como em algo
como num exercício metonímico:

“o passo da iguana
e seu sistema de indeterminação: forma

ou velocidade?”

Iguana:
teus olhos frios na pedra laranja,
rapidíssimos,
como final de toon.-


Este final inesperado de cartoon acompanhará muitos de seus poemas e é uma espécie de fuga da fixidez: é forma ou movimento? Este final de toon é um pouco também como sua partida do Brasil. O que era mesmo que ele dizia naquela tarde em que nos conhecemos? Já não lembrava bem, havia uma indeterminação na imagem, mas uma manhã ele escreveu para contar que sonhou que estava no Brasil e ficava angustiado porque tinha muitas coisas para fazer no que chamava agora de sua casa e não se lembrava de ter planejado uma viagem assim tão longa.

Então me perguntava: “isso aqui é um sonho, verdade?”. Respondia que aquilo era um sonho sim, “mas que ele vinha sonhando com isso havia muito tempo já.” Tenta ligar o walkie-talkie ou algo com fio que possa fornecer as informações mais recentes no aberto de um deserto, na curva de um espaço: estabelecer de que lado está quem, o que é real e o que é sonho, quem ou o que estão dizendo esses, aqueles poemas. E quais formas eles devem ter: um disco na névoa, um puzzle de montanhas chinesas ou a capacidade de reter um pixel da imigrante húngara passeando por Nova Iorque, saída de um filme de Jim Jarmusch:


Eszter

Um pixel da tua pele –
Uma peça da rarefação, a coleção
do sonho, como um crawl
na neve
eras o pardal no poste,
sacudindo-se apenas

e em Manhattan, tomando
um chá: como aquela
garotinha de Hopper

também você um chapéu.
Mas você: uns óculos,
um impala ‘68,
uma música.-


A história do sonho contada naquele dia poderia ser um poema em que um assobio seca os pássaros no ar ou um poema sobre a personagem sentada na varanda escura olhando para as luzes da cidade depois de ter ido embora. Talvez seja um jogo de deslocar-se constantemente de formas o que fazem seus textos, de mudar de lugar para contar essas histórias de outra maneira, talvez este seu teste da iguana: figura de velocidade e forma, em perpétuo desmontar-se e que deveria, constantemente, estar fazendo alguma outra coisa.

Ao contar sobre a “infância do seu procedimento”, Aníbal diz que tenta sempre usar uma caneta ou algo que não faça muita pressão sobre o papel, para não deixar, como nos filmes policiais, a mensagem marcar a folha por debaixo e ser descoberta depois. No livro krill (2004), reconhecemos esse mundo em que se tenta não marcar muito o papel, um mundo sempre escapando mas que volta de uma outra maneira com a presença da série. E neste livro podemos pensar em série tanto no sentido de variações, como os belíssimos poemas da série “Filhas do capinzal”, se multiplicando e vestindo diferentes máscaras ao longo do livro: versão mangá, versão western ou versão galáctica, por exemplo, mas também podemos pensar em série de seriado, filme policial, em que sem perceber vamos colecionando as diversas pistas, como os exploradores espalhados pelo seu livro: às 3 a.m., a garota indiana em Denver, os 19 suspeitos ou esses cabelos que poderiam entregar a filha do capinzal:


Filha do capinzal (uma canção)

A que arranhou o disco da névoa
enquanto todos dormiam em suas roupas
risíveis, era eu.

A que teve um sonho nas gengivas
até que as frutas apagaram suas lembranças
e gravaram seqüências, na
noite do paladar – era eu.

Que a lua não venha, agora
que peço. Que os macacos caminhem
de mãos dadas, em santidade.

Por seus relâmpagos os reconhecerás. Verás
o que o encantador não diz.
A que esculpiu seus heróis nas unhas, a que
curou as pedras, era eu.

E a que viu o koala, mantendo relações
com sua mulher, e o trevo de saturno, com suas
dez folhas bruxas, era eu.
Que a peste carregue este caderno.
Que os exploradores não encontrem meus cabelos.-


Reproduzo aqui outro poema da série "Filha do capinzal", agora a versão japonesa:

Filha do capinzal (mangá version)

Isto
parece o quarto da garota, com tantos cyber
posters, a limonada e
a mochila em cima de uma cama. Que
olhos são aqueles, estes, admirados
e abertos como uma cerejeira em flor?

Deitada aqui
escuto o ploc das botas
no convés, o som
das baleias azuis neste mar congelado.

Tudo tão quieto
como um teatro nô. E no
pesqueiro
lembro teus beijos japoneses, teu andar
iluminado por uma chuva fina, teu
dizer digital.-

Falando em variações, krill explora a ideia de série de maneiras diversas e apresenta também algumas “versões” para poemas de outros autores, como se fossem covers de músicas. Há, por exemplo, uma versão do poema “O urso”, de Ted Hughes, ou então de “Distancias incomensuráveis”, da Lu Menezes:


Distâncias incomensuráveis

Um espelho cai e bate
se quebra contra
estrelas se desfazem
na noite imaginária de um céu
do pensamento. Muito e pouco

distam
das estrelas e luas de strass
que sobre a mesa de um camelô
o sol faz brilhar: “a BBC

sonhava com tudo o que eu – mas eu
só comigo sonhava!”gritou
Souza, pela oniaudiente megafone instalado
em sua mente. Pela TV se vê
que para atrair os índios, um
espelho
foi deixado brilhando no matagal.

Mas quem afasta verdes feixes
de elétrons, e penetra
no vibrante espaço do capinzal
– distante e infinito –
sou eu. Eu:

trânsfugo índio que acha
a trânsfuga estrela no chão.-


Do livro krill, seguem mais dois belíssimos poemas, gravados no vídeo acima, “Céu do siamês” e “Ema”:

Céu do siamês

Oculto entre os cobertores, falo
com o siamês; “siamês, vamos para o Novo
México, quero ver a ruína
da ferrugem ao sol, e o
deserto de dias, um
cacto”. Cada um de nós

leva o roçar de suas pedras
na mão, compara
o método de seu rosto na ilha do medo. Eu

sou assim, e também
posso ser como você, fracassar
ao morder uma
pêra, ou um biscoitinho
qualquer. Siamês, me leva para longe, diz em

meu ouvido a tua posição
neste céu branco
do navio; e do falar, diz
cada repetição de
tuas palavras, aonde te
conduzem.-


Cielo del siamés Escondido en las mantas, hablo / con el siamés; “siamés, vamos a Nuevo / México, quiero ver cómo se arruina / el óxido en el sol, y el / desierto de días, un / cactus”. Cada uno de nosotros // lleva el rozar de sus piedras / en la mano, compara / el método de sus mejillas en la isla del miedo. Yo // soy así, y también / puedo ser como vos, fracasar / al morder una // pera, o cualquier / galletita. Siamés, llevame lejos, contame // en el oído cuál es tu posición / en este cielo blanco / del navío; y del hablar, decime / cada repetición de / tus palabras, adónde te / conducen.-



Ema

Chega a ema – cansada
de transmitir seu acorde – e sussurra
em teu ouvido:

– basta de peso físico, diz
– pastar, diz

Mas a ema é a bomba
de tempo! É o ladrão! Te descobre
sentado entre as rochas:

– vamos para o aberto, diz
– a curva do espaço, diz

Se há um diamante, é
o da persuasão e distração – como um
ilusionista: “o segredo é a viagem”; sonha
que te hipnotiza; mas também:

– “Eu não sou a ema! A ema
é invisível; e não é verdade
que olhe o céu, aguardando instruções.”-


Ñandú Llega el ñandú – cansado / de transmitir su acorde – y susurra / en tu oído: // – basta de peso físico, dice / – a pastar, dice // Pero el ñandú es la bomba / de tiempo! Es el ladrón! Te descubre / sentado entre las rocas: // – vamos hacia lo abierto, dice / – la curva del espacio, dice // Si hay un diamante, es / el de la persuasión y distracción – como un / ilusionista: “el secreto es el viaje”, sueña / que te hipnotiza; pero también: // –“Yo no soy el ñandú! El ñandú / es invisible, y no es cierto / que mire al cielo, esperando instrucciones”.-

E, por último, reproduzo o poema (ainda inédito em português) de seu projeto em andamento "Brazilian Grooves", composto de textos dedicados a amigos brasileiros:


Pane para um Monge Acrobata
à memória do Leo

Mas quem é que manda você sair sem lembrar
do chapéu, nem

da melodia que vinha assobiando, com os sapatos
cheios de sabão, pisando na
corda

bamba, com seu sorriso triste, logo
quando cortam a luz? Quem manda
embaixo desse céu inundado de peixes, com a tormenta
elétrica distorcendo as palavras, a
comunicação da torre
de controle, a batida do samba? Há um segundo

em que tudo pára, se interrompem
as notícias das Syferts do fundo do universo, a
mastigação das zebras da savana, a corrida
do jockey de camisa laranja; e ainda outro segundo
onde a movimentação é retomada

exatamente no sentido inverso: escutamos a voz da mulher
dizer

“…mmmaf… sssequências cervicais
do acrobata… mmmhuem… “

e

“…shhhhnnai? cervicais de um
ouriço , Om?”, enquanto os anéis de fumaça
do seu cigarro

voltam aos seus pulmões. Desta vez
o efeito vai nos jogar
longe daqui, Leo, na paisagem tropical
do rótulo

de uma garrafa de rum
bem na hora em que alguém
se serve de um copo, deixando os coqueiros
de cabeça para baixo; ou, com o macacão sujo por concertar a nave, no meio do estádio
de Wembley, verde fosforescente
na Playstation em que duas crianças

brincam de brigar pelo chute do Messi
na hora dos pênaltis: o que
vamos fazer ali no meio, Leo? A verdade é que assim

vou acabar
podendo ouvir cada vez menos músicas, ler
menos criticas, ter menos medo de escutar tua risada
quando eu falo bobagens. Aí seguimos, mais

ou menos os dois, aproximadamente
eu e você, o que quer que isso seja,
contra o fundo instável do poema.-

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Gravamos o vídeo que abre esta postagem em uma tarde de abril de 2009 em Barcelona, na Carrer de casp, depois de um almoço com a Mônica. Quando enviei o link do vídeo, Aníbal respondeu: “é estranho me ver sem você do outro lado da tela.”